Resumo
A aposentadoria por idade rural é um dos benefícios mais importantes do INSS, mas frequentemente os segurados são alvos de negativas injustas. Neste artigo, abordamos um breve histórico das leis sobre o tema, quem tem direito à aposentadoria, os documentos exigidos para comprovação da atividade rural, o que é considerado início de prova material, como funciona a carência, se as regras são as mesmas para todos os segurados rurais e respondemos as principais dúvidas sobre o assunto. Ademais, explicamos o que pode ser resolvido no INSS e quando é melhor acionar a via judicial, de acordo com a legislação atual e as principais jurisprudências sobre o tema.
1) Introdução
A aposentadoria por idade rural é um dos benefícios mais importantes da Previdência Social, com um potencial de ser concedido a milhões de segurados do INSS que cumprem os seus requisitos.
Contudo, existem diversos pontos que merecem atenção. Afinal, as exigências dessa prestação tem diferenças bem marcantes em relação às demais, o que influencia no momento da análise e dos requerimentos!
🤓 Além disso, os segurados que podem gozar desse tipo de benefício também têm que cumprir com certas determinações legais específicas para se enquadrar nas hipóteses previstas, o que traz ainda mais elementos para o estudo dos casos.
Resolvi escrever o artigo de hoje para lhe explicar tudo sobre a aposentadoria por idade rural, incluindo informações fundamentais, base legal, dicas e estratégias que ajudam bastante na prática.
Com isso, espero deixar a sua atuação nesse assunto mais tranquila, tanto no momento das análises, como também na hora de elaborar um requerimento administrativo ou até a própria ação judicial!
👉🏻 Dá uma olhada em tudo o que você vai aprender:
- Um breve histórico do tema;
- Quem tem direito a aposentadoria por idade rural;
- Se a Reforma da Previdência mudou esse benefício;
- Quais são os documentos para comprovação da atividade rural;
- Como funciona o início de prova material nesses casos e qual documentação é aceita dessa forma;
- Como funciona a carência para essa aposentadoria;
- Se as regras são as mesmas para todos os segurados rurais;
- As respostas para as 7 principais dúvidas do assunto.
E, para facilitar a vida dos nossos leitores, quero deixar a indicação de um Modelo de Petição Inicial para Atividade Especial + Rural que tem lá no site dos nossos parceiros do Cálculo Jurídico.
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2) Breve histórico
Em primeiro lugar, quero trazer um breve histórico da aposentadoria por idade rural, com a intenção de mostrar um panorama sobre esse benefício ao longo do tempo, com foco nas mudanças mais recentes. 👩🏻🌾👨🏻🌾
Afinal, nem sempre as regras foram as mesmas e até mesmo os beneficiários eram diferentes, a depender da época.
📜 Antes da Constituição atual e da Lei n. 8.213/1991, na vigência do Decreto n. 83.080/1979, a aposentadoria por idade rural só era permitida para o segurado homem. A mulher apenas poderia conseguir a prestação se fosse a chefe ou arrimo de família.
Antes da Lei n. 8.213/1991, existiam regimes distintos de previdência: dos segurados rurais e dos urbanos.
O regime rural era chamado de PRORURAL (Programa de Assistência ao Trabalhador Rural).
Acontece que o destinado aos rurícolas, apesar de pioneiro, era um tanto quanto restritivo em relação a cobertura. Só os homens tinham direito à aposentadoria, por exemplo, e não havia contribuição direta, apenas a necessidade de se comprovar o labor no campo.
🤯 Além disso, ele não possuía as mesmas características ou previsões dos regimes urbanos. Inclusive, alguns benefícios só eram destinados a quem trabalhava na cidade.
[Obs.: Se quiser se aprofundar mais no assunto, é só ler o artigo sobre o Enunciado n. 15 do CRPS, que fala sobre o reconhecimento de tempo especial para períodos rurais exercidos antes da Lei n. 8.213/1991.]
Porém, a situação foi alterada ao longo do tempo e atualmente as regras são bastante distintas (acompanhando, naturalmente, as mudanças da sociedade e as exigências da proteção previdenciária).
Desde a Constituição Federal de 1988, a aposentadoria dos segurados rurais tem uma previsão constitucional. E essa determinação prevê uma redução de 5 anos no requisito da idade para eles.
🧐 Essa diminuição faz sentido, porque o trabalho no campo é, notoriamente, mais exigente, em regra, do que o da cidade. Isso ocorre tanto pelas condições do labor, como o ambiente em que as atividades são desenvolvidas e a própria natureza braçal delas.
Acontece que, curiosamente, o fato da Constituição Federal prever a aposentadoria por idade rural não significou que esse benefício “valesse” desde aquele momento. O STF decidiu que a disposição não era autoaplicável (RE 168.191/RS, 2° Turma, Relator Min. Marco Aurélio, DJ 20.06.1997).
Então, apenas com a Lei n. 8.213/1991 que tivemos realmente uma legislação sobre o assunto permitindo a sua aplicação na prática. Foi a partir daí que a possibilidade de se aposentar se estendeu aos outros membros da família.🤗
Desde aquele momento, as novas regras foram fixadas e, como vou explicar para você nos próximos tópicos.
Então, podemos dividir a história da aposentadoria por idade rural em 2 grandes momentos: antes e depois da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 e da Lei n. 8.213/1991.⚖️
3) Quem tem direito à aposentadoria por idade rural?
Para ir direto ao ponto, quem tem direito à aposentadoria por idade rural são os trabalhadores e segurados rurais do RGPS. Apenas esses podem, com base na Constituição Federal e nas normas legais sobre o assunto, ter o benefício. 👩🏻🌾👨🏻🌾
Porém, existem alguns detalhes que precisam de atenção quanto a isso, porque não basta simplesmente morar ou trabalhar no campo para automaticamente se enquadrar nessas possibilidades.
📜 Posso lhe dizer que são 4 tipos de segurados os considerados como rurais para fins previdenciários. Essa determinação está no art. 48, §1º, da Lei de Benefícios, que permite a diminuição da idade mínima para a aposentadoria para 60 e 55 anos (homens e mulheres):
“Art. 48, A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.” (g.n.)
👉🏻 Portanto, podem ser considerados como trabalhadores rurais, com direito a aposentadoria por idade rural e a redução de 5 anos do requisito etário, as seguintes categoriais:
- Segurado especial (art. 11, inciso VII da LB);
- Empregado rural (art. 11, inciso I, alínea “a” da LB);
- Trabalhador avulso rural (art. 11, inciso VI da LB);
- Contribuinte individual rural (autônomo) (art. 11, inciso V, alínea “g” da LB).
Algumas considerações precisam ser feitas quanto a quem pode se aposentar dessa forma.
A primeira delas é que o bóia-fria, tipo de trabalhador rural tão comum no Brasil, se enquadra como um contribuinte individual para o INSS.
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ Porém, a jurisprudência entende de outra forma, equiparando ele ao segurado especial, com todas as consequências decorrentes disso (vou falar mais sobre isso no tópico 6.2).
Em segundo lugar, é importante lembrar que o segurado especial engloba o pequeno produtor rural, individual ou em regime de economia familiar. Mas o seringueiro, extrativista vegetal e o pescador artesanal também são considerados dessa forma, ok?
3.1) Na prática – o que faz cada um dos segurados rurais?
O mais tranquilo de exemplificar é o empregado rural, que nada mais é que um trabalhador com registro em CTPS, que presta serviços a alguma empresa ou proprietário de imóvel no campo. Um funcionário de uma grande fazenda que faz serviços na lavoura, por exemplo.
🤓 Já o “bóia-fria” pode ser considerado como um eventual rural, que trabalha sem registro formal.
Ele presta serviços em várias fazendas, sítios e propriedades rurais, de maneira não habitual, assim como um autônomo. Mas a realidade é bem dura com essa categoria, que em regra não tem contribuições ao INSS e encontra muitas dificuldades para se aposentar.
Diante disso, existem muitas discussões sobre qual a sua “categoria”, já que a autarquia tem uma posição, mas existem muitas críticas à sua interpretação. E a jurisprudência, como mencionado, segue outra linha.
Por sua vez, os avulsos rurais também não têm um vínculo fixo com um empregador, mas como trabalham com a intermediação de um sindicato ou, em alguns casos, de órgão gestor, costumam ter menos problemas no recolhimento para a autarquia.💰
Finalmente, os segurados especiais rurais são aqueles que moram em imóveis no campo ou em cidades próximas a ele, com atividades na lavoura ou pecuária em regime de economia familiar ou individualmente.
Pequenos produtores rurais que exploram imóveis de até 4 módulos fiscais, o seu cônjuge/companheiro, o filho maior de 16 anos ou equiparado que trabalham em conjunto com o segurado especial também se enquadram dessa forma. 👩🏻🌾👨🏻🌾
[Obs.: entende-se que o trabalho infantil rural deve ser reconhecido antes dos 12 anos em casos concretos.]
Reforçando, o seringueiro, extrativista vegetal e o pescador artesanal ou assemelhado também podem ter essa caracterização.
🧐 Aliás, o segurado especial é um dos que mais enfrentam obstáculos na hora de pedir os benefícios, porque não é raro que sejam colocadas barreiras sem fundamento legal ou jurisprudencial para o reconhecimento do direito dessa categoria.
Inclusive, acabei de publicar um artigo explicando porque o fato do segurado especial ter bens em seu nome não descaracteriza a condição.
Esse é mais um argumento que o INSS vem utilizando para negar a concessão do benefício. Por isso vale muito a pena conferir o artigo e conferir dicas práticas sobre como defender o cliente nesses casos! 😉
4) A Reforma da Previdência alterou a Aposentadoria por Idade Rural?
A EC n. 103/2019 modificou profundamente o direito previdenciário e essas alterações atingiram em grande parte os requisitos para muitos benefícios.
Em regra, essas mudanças não foram favoráveis para os segurados, como aconteceu, por exemplo, com o aumento da idade mínima para se aposentar e a diminuição da RMI de pensão por morte, por conta de um novo sistema de cálculos.😕
Porém, entre tantas disposições desfavoráveis, o benefício de quem trabalha no campo conseguiu se manter como estava.
Isso porque a Reforma da Previdência não mudou as regras da aposentadoria por idade rural. Não houve alteração nas exigências, requisitos ou forma de cálculo, com a manutenção das previsões legais anteriores.
📜 Então, segue valendo a disposição do art. 201, §7º, inciso II, da Constituição Federal quanto a esse benefício:
“Art. 201, § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
II – 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.” (g.n.)
👉🏻 Da mesma forma, é aplicada a legislação previdenciária sobre o assunto, em especial o art. 39, inciso I da Lei n. 8.213/1991, que rege a aposentadoria por idade rural para os segurados especiais:
“Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I – de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B desta Lei; ou” (g.n.)
Mesmo o artigo mencionando apenas os segurados especiais, essas regras da aposentadoria rural costumam valer para todos os trabalhadores rurais, conforme as previsões constitucionais.👩🏻🌾👨🏻🌾
Portanto, se o seu cliente chegar até você preocupado com a Reforma da Previdência, mas se enquadrar em algumas das hipóteses da aposentadoria por idade rural determinadas pela Constituição ou pela Lei de Benefícios, pode tranquilizá-lo.
📝 Afinal, a EC n. 103/2019, mesmo mudando muita coisa, não atingiu esse benefício, que segue com os mesmos requisitos de antes:
● Se enquadrar como trabalhador rural (empregado rural, eventual, contribuinte individual rural, trabalhador rural avulso ou segurado especial rural);
- Idade mínima de 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher;
- 180 meses de atividade rural para fins de carência;
- Trabalho rural imediatamente anterior ao momento do requerimento ou a data de completar a idade mínima.
Aliás, vale dizer que, antes do aumento da idade mínima para se aposentar promovido pela EC n. 103/2019, os homens e mulheres que trabalhavam no campo poderiam requerer o benefício 5 anos antes dos segurados urbanos.
Atualmente, é ainda mais interessante para as mulheres, já que o requisito é ter 55 anos nesta modalidade (enquanto que nas aposentadorias programadas ou híbridas é de 62 anos). 🗓️
5) Documentos para comprovação da atividade rural
O segurado deve apresentar documentos para comprovação da atividade rural. 📝
Afinal, apenas os trabalhadores rurícolas (que mencionei no tópico 3) têm direito a aposentadoria por idade rural, com a redução da idade e demais requisitos diferenciados.
👩🏻🌾👨🏻🌾 Contudo, há um ponto fundamental: é obrigatório provar que o seu cliente, de fato, se encaixa na definição de segurado rural para os fins legais. Do contrário, não será possível a concessão desse benefício.
Daí a importância da prova documental e a exigência de documentação, tanto no INSS, como na justiça.
Existe a necessidade de, no momento do requerimento da aposentadoria por idade rural, anexar documentos para comprovar a atividade rurícola do seu cliente. Por isso, desde o primeiro momento é interessante já separar o que será preciso.
🤔 “Alê, e como é feita essa comprovação?”
A documentação que deve ser apresentada ao INSS varia bastante conforme o tipo de segurado rural em questão.
Entre elas, a autodeclaração é especialmente importante, principalmente no caso do segurado especial. Mas só isso não basta.
⚖️ O art. 106 da Lei n. 8.213/1991 traz um rol de documentos permitidos como forma de comprovação dessa atividade:
“Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, complementarmente à autodeclaração de que trata o § 2º e ao cadastro de que trata o § 1º, ambos do art. 38-B desta Lei, por meio de, entre outros:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III – revogado;
IV – Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, de que trata o inciso II do caput do art. 2º da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, ou por documento que a substitua;
V – bloco de notas do produtor rural;
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7o do art. 30 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da produção;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.” (g.n.)
Como disse, são vários documentos que podem ser usados para comprovar a atividade rural, a depender da realidade de cada um e das funções que desenvolvia.
Por exemplo, se o seu cliente for um segurado rural empregado, em regra basta que seja apresentada a CTPS ao INSS no momento do pedido de aposentadoria por idade rural, que os vínculos serão considerados dessa forma.🤗
Já no caso de um segurado especial, por exemplo, o bloco de notas e as notas fiscais são uma documentação muito importante para a comprovação do tempo perante a autarquia.
📜 Mas, na ausência de alguns desses documentos, a IN n. 128/2022, em seu art. 48, §2º, permite que a comprovação de trabalho rural do empregado, até 31/12/2010 seja feita por meio de uma justificação administrativa, desde que baseado em início de prova material:
“Art. 48, § 2º Além dos documentos e procedimentos previstos neste artigo, a comprovação da atividade rural do segurado empregado exercida até 31 de dezembro de 2010, para fins de aposentadoria por idade de que trata o art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991, poderá ser feita por meio de Justificação Administrativa – JA, desde que baseada em início de prova material e observado o art. 571.” (g.n.)
Inclusive, essa questão do início de prova material é fundamental para a análise dos casos que envolvem a aposentadoria por idade rural, por uma série de motivos. Além do fato de ser exigida pela IN como base para a comprovação via justificação administrativa.
5.1) Sobre o início de prova material para atividade rural
É bastante conhecida a dificuldade de obter documentos que comprovem, a cada ano, o período de trabalho rural dos segurados que trabalham ou trabalhavam no campo. 😕
Seja pela própria falta de documentação, pelo passar dos anos, pela informalidade ou por outros motivos, existem casos de pessoas que se dedicaram ao labor rurícola toda a vida, mas possuem pouquíssimos registros disso.
🧐 É aí que entra a importância do chamado início de prova material!
Além de ser fundamental para a comprovação por meio da justificação administrativa, ele é necessário como base do pedido do reconhecimento de intervalos dos períodos rurais em que não se tem tanta documentação assim.
🤔 “E como é que ficam esses casos, Alê?”
Bem, até um tempo atrás, o INSS costumava exigir que o segurado apresentasse uma prova de trabalho rural para cada ano de atividade. Mas isso era extremamente complicado, por conta da realidade desse tipo de labor e da dificuldade de documentação.
Na prática, acabava limitando bastante a possibilidade de reconhecimento do tempo no campo, prejudicando os requerentes.
A justificação administrativa é uma forma de contornar esse obstáculo. E aí os empregados rurais, os bóias-frias e avulsos devem apresentar os documentos do início de prova material para, em conjunto com testemunhas, comprovar o período pleiteado. 🗓️
O pulo do gato é que início de prova material não precisa ser referente a todo o tempo de serviço rural, basta que indique a atividade no campo em certas épocas, contemporaneamente, e esteja formalmente correto.
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ Inclusive, essa é a posição da Súmula 14 da TNU:
“Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício.” (g.n.)
⚖️ O entendimento majoritário do STJ também permite a comprovação de todo um período rural com base em documentos apenas de alguns anos, em conjunto com a prova testemunhal.
Por exemplo, olha só essa ementa:
“PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TEMPO DE SERVIÇO. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE AGRÍCOLA NO PERÍODO DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL AMPLIADO POR PROVA TESTEMUNHAL. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ.
1. O Tribunal a quo concluiu o seguinte: “os documentos apresentados pela parte autora configuram início razoável de prova material da atividade de rurícola em atenção à solução pro misero, adotada no âmbito do Colendo STJ e pelos Tribunais Regionais Federais; a prova oral produzida nos autos confirma sem sombra de dúvidas a qualidade de trabalhador rural da parte autora” (e-STJ fl. 72).
2. Para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, não há exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se quer comprovar; basta o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória, como ocorre na hipótese. Precedentes. (…)” (g.n.)
(STJ, AgRg no AREsp n. 286.515/MG, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma. Julgamento em: 13/03/2013)
Esse entendimento dos tribunais sobre a matéria deve ser comemorado, porque seria extremamente complicado exigir um documento por ano fosse seguido. 🤗
Imagine o caso de uma pessoa que trabalhou de 1972 até 1990 no campo, mas tem documentação apenas de 1972, 1975, 1976, 1979, 1980, 1984, 1986, 1987, 1989 e 1990.
Se fosse somente permitido considerar como tempo rural os anos em que existem documentos comprovando a atividade, seriam reconhecidos apenas os acima indicados, e não o intervalo todo, que vai de 1972 até 1990. 🗓️
Felizmente, como a posição dos Tribunais é outra, é possível, ao menos na via judicial, reconhecer todo o período, do início até final, como atividade rural nesse caso. Basta que a documentação esteja acompanhada das testemunhas.
Isso, segundo o art. 48, §2º da IN n. 128/2022, também é possível em relação à justificação administrativa. 🏢
Mas sempre lembrando que, em qualquer instância, é preciso o início de prova material, além das testemunhas.
5.2) Documentos que podem servir como início de prova material
🤔 “Alê, mas afinal, o que pode ser considerado “início de prova material”?
Não existe um “rol fechado” sobre o que pode ser interpretado dessa forma. A documentação do art. 106 da Lei de Benefícios comprova o trabalho rural no ano indicado, mas pode servir de início de prova material para um intervalo maior, por exemplo.
🧐 Porém, diante da realidade do campo e do fato de muitas vezes a informalidade reinar, com negócios verbais ou serviços prestados sem registro, há uma dificuldade de se fechar uma lista do que pode ou não ser considerado dessa forma.
Portanto, na prática e a depender da situação há diversos documentos que podem servir como início de prova material do trabalho rural, desde que tenham anotações que demonstram esse fato.
⚖️ A Turma Nacional de Uniformização já possui diversos julgados sobre o assunto e aceita, entre outras, as seguintes documentações:
- Documentos escolares do segurado ou de seus filhos, emitidos por escolas rurais;
- Certidões de nascimento e/ou casamento do segurado ou dos filhos, com anotação de profissão rural;
- Certidões de sindicatos rurais e da Justiça Eleitoral;
- Certidões de propriedade de imóvel rural.
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ Observe as decisões da TNU nesse sentido:
“PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE TRABALHO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. HISTÓRICO ESCOLAR. CERTIDÃO DE NASCIMENTO OU CASAMENTO DOS FILHOS. VALIDADE. PUIL PROVIDO.
1. DOCUMENTOS ESCOLARES DO SEGURADO OU SEUS DESCENDENTES EMITIDOS POR ESCOLA RURAL CONSTITUEM INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMO HÁ MUITO JÁ ASSENTADO POR ESTA TURMA NACIONAL.
2. TAMBÉM AS CERTIDÕES DE NASCIMENTO E CASAMENTO DOS FILHOS, QUE INDIQUEM A PROFISSÃO RURAL DE UM DOS GENITORES, CONFIGURA INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMO ALIÁS, JÁ DECIDIU O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
3. TESE: CONSTITUEM INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA CONDIÇÃO DE TRABALHADOR RURAL: (I) DOCUMENTOS ESCOLARES DO SEGURADO OU SEUS DESCENDENTES EMITIDOS POR ESCOLA RURAL; E (II) CERTIDÕES DE NASCIMENTO E CASAMENTO DOS FILHOS, QUE INDIQUEM A PROFISSÃO RURAL DE UM DOS GENITORES.
4. PUIL PROVIDO.” (g.n.)
(TNU, PEDILEF n. 5000636-73.2018.4.02.5005/ES, Rel. Juiz Federal Fábio de Souza Silva. Julgamento em: 20/11/2020. Publicado em: 23/11/2020)
“Certidões de sindicato rural e da Justiça Eleitoral servem como início de prova material.” (g.n.)
(TNU, PEDILEF n. 0006786-13.2011.4.01.4300/TO, Julgamento em: 24/11/2016)
“(a).1 – o histórico escolar emitido por escola rural, e certidão de propriedade, mesmo que em nome do pai, podem, em tese, servir como início de prova material para comprovação de atividade rural em regime de economia familiar;
(a) 2. – não há necessidade de que a prova material abranja todo o período pleiteado, diante da extensão probatória prospectiva ou retroativa, desde que conjugadas com prova testemunhal harmônica e convincente.” (g.n.)
(TNU, PEDILEF n. 5004841-66.2013.4.04.7107/RS, Julgamento em: 11/09/2014)
Tudo isso pode lhe ajudar na prática nos casos de aposentadoria por idade rural dos seus clientes!
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6) Carência na aposentadoria por idade rural
🧐 O requisito da carência na aposentadoria por idade rural é um outro ponto de bastante interesse e que exige atenção. Os advogados previdenciaristas devem ter cautela quanto abordarem esse aspecto nas análises dos casos dos seus clientes.
Nas demais categorias de segurado, para a concessão de benefícios, a carência é comprovada pelos recolhimentos ao INSS, em regra.
Mas, quem trabalha no campo tem um tratamento diferenciado da legislação previdenciária quanto a isso.
📜 Com base no art. 48, §2º da Lei n. 8.213/1991, o segurado rural precisa comprovar, para fins de carência, o efetivo exercício do trabalho ou atividade rural, mesmo que descontinuamente, pelo período mínimo exigido para a concessão do benefício requerido
A mesma norma ainda garante que isso deve ser provado até o tempo imediatamente anterior ao requerimento administrativo:
“Art. 48 § 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei.” (g.n.)
Lembrando que a jurisprudência também admite que essa exigência seja cumprida no momento antes de se completar a idade mínima.
Como para todos os benefícios de aposentadoria (com a exceção da por incapacidade permanente) são necessários o cumprimento de 180 meses de carência, para a aposentadoria por idade rural, o segurado deve comprovar 180 meses de atividade rural.🗓️
Inclusive, nesse período são considerados o exercício de funções remuneradas na entressafra, de até 120 dias por ano, de mandato eletivo de dirigente sindical rural, de vereador na cidade do imóvel rural e de diretor de cooperativa de segurados especiais.
Além disso, os intervalos de parceria, meação, atividade artesanal com produtos do campo e atividade artística em valor inferior a um salário mínimo também podem ser assim computados. 😊
6.1) Critérios específicos para empregado rural e contribuinte individual
O empregado rural, além do contribuinte individual rural que seja assentado, parceiro, meeiro, arrendatário ou membro de cooperativa, tem regras específicas sobre a carência que devem ser observadas.
📜 Esses requisitos estão no art. 3º da Lei n. 11.718/2008:
“Art. 3o Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência:
I – até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991;
II – de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e
III – de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil.” (g.n.)
Portanto, para essas categorias de trabalhadores rurais, em determinadas épocas, 1 mês de trabalho comprovado pode significar 2 ou até 3 meses no cálculo para fins de carência, o que pode ajudar bastante na hora de cumprir esse requisito.🤗
Então, fique atento a isso no momento de analisar os casos de possíveis clientes empregados ou contribuintes individuais rurais, ok? Pode fazer toda a diferença na prática contar com alguns meses a mais na hora do requerimento.!
6.2) E o boia-fria?
O problema é que esse mesmo art. 3º da Lei n. 11.718/2008 é usado pelo INSS para criar um obstáculo ao reconhecimento do direito dos bóias-frias à aposentadoria por idade rural. 🙄
Acontece que a autarquia, com base no parágrafo único da norma, equipara esses trabalhadores aos contribuintes individuais, exigindo, dessa forma, os recolhimentos dos períodos de labor a partir de 01/01/2011, para contagem com fins previdenciários.
Observe o que determina o art. 3º, parágrafo único, da Lei n. 11.718/2008:
“Art. 3º Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego.” (g.n.)
Ou seja, se depois dessa data o boia-fria não recolhesse, o seu tempo de serviço rural, na visão do INSS, não contaria nem para carência, nem para tempo de contribuição. 😕
Aliás, por falar no assunto, você sabia que o período de serviço militar conta como tempo de contribuição? Acabei de publicar esse artigo sobre o tema, vale muito a pena conferir!
Mas, voltando a falar dos bóias-frias, não preciso nem dizer que isso é uma posição extremamente complicada, restritiva e que prejudica demais os segurados, né? Afinal, isso dificulta o reconhecimento do direito dessa categoria, que trabalha na informalidade e em regra com salários muito baixos.
Felizmente, a posição dos Tribunais é bem mais favorável aos segurados rurais bóias-frias. 😍
A justiça, em entendimento majoritário, tem equiparado essa categoria de trabalhador rural ao segurado especial, o que dispensa a necessidade do recolhimento das contribuições para contagem da carência.
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ Inclusive, a Turma Nacional de Uniformização e o Superior Tribunal de Justiça tem vários julgamentos nesse sentido.
Entre eles, cito o PUIL n. 0001191-14.2016.4.01.3506/GO, da TNU, em que ficou decidido que o trabalhador rural denominado boia-fria, diarista ou volante é equiparado aos segurados especiais para fins previdenciários:
“PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PERÍODOS COMO EMPREGADO E DIARISTA RURAIS. DIARISTA, BOIA-FRIA E SAFRISTA. EQUIPARAÇÃO COM O SEGURADO ESPECIAL PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DA TNU. SOMA DE TEMPOS COMO EMPREGADO E SEGURADO ESPECIAL. POSSIBILIDADE QUE DECORRE DA CF/88, DA LEI 8.213/91 E DA PRÁTICA RURAL BRASILEIRA. DIVERGÊNCIA DE JULGADOS DEVIDAMENTE DEMONSTRADA. ACÓRDÃO EM DESCOMPASSO COM A JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DA TNU. PUIL CONHECIDO E PROVIDO COM REAFIRMAÇÃO DE TESES. RETORNO DOS AUTOS PARA ADEQUAÇÃO NA FORMA DA QO/TNU Nº 20.”
(TNU. PEDILEF n. 0001191-14.2016.4.01.3506/GO. Rel. Juiz Federal Ivanir César Ireno Júnior. Julgamento em: 28/04/2021. Publicado em: 29/04/2021)
⚖️ O STJ seguiu o mesmo entendimento nos julgamentos do REsp n. 1.762.211 (como também no AgInt no AREsp n. 1.616.518, AREsp n. 1.556.301 e AgInt no REsp n. 1.825.987):
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADOR BÓIA-FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição de bóia-fria, equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários.
2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de comprovação de recolhimentos previdenciários para fins de concessão de aposentadoria rural (REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012).
3. É inegável que o trabalhador bóia-fria exerce sua atividade em flagrante desproteção, sem qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de razoabilidade em se exigir que deveriam recolher contribuições previdenciárias.
4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento.”
(STJ. REsp n. 1.762.211/PR. Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. 1ª Turma. Julgamento em: 27/11/2018. Publicado em: 07/12/2018)
Isso deve ser comemorado e as decisões favoráveis podem ser usadas nas suas ações judiciais. Mas, atenção ao fato de que ainda não há um precedente vinculante, ok? 🧐
7) As 7 Principais Dúvidas sobre Aposentadoria por Idade Rural Solucionadas
Estamos nos encaminhando para o final do artigo, mas eu não poderia deixar de passar para você algumas informações finais muito importantes sobre o tema. Então, aqui estão as respostas para as 7 principais dúvidas sobre a aposentadoria por idade rural!
Isso pode lhe ajudar bastante nos seus atendimentos, além de também servir como apoio nos planejamentos e análises previdenciárias! 😉
7.1) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo?
Sim! É possível que, em certas situações práticas, seja reconhecido o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado ao INSS ou ao juízo. Essa é uma excelente notícia, mas existem algumas ressalvas.
⚖️ Há regras sobre o assunto muito bem definidas pela jurisprudência, e a documentação (início de prova material) não deixa de ser necessária, mas a possibilidade, de fato, está presente!
Esse é um ponto muito importante sobre a aposentadoria por idade rural, porque não é raro que o segurado, seja ele o pequeno produtor rural ou até mesmo o trabalhador rural sem registro, como o bóia-fria, tenha documentos, mas não desde o início do labor no campo.
Muitos começam a trabalhar bastante jovens, só que apenas possuem alguma documentação após um certo tempo.
Se apenas fosse possível considerar o tempo de serviço rural depois do primeiro documento, diversos segurados rurais seriam muito prejudicados. Mas, felizmente, não é isso que acontece.
A jurisprudência tem posição firme favorável aos beneficiários, permitindo o reconhecimento do período de trabalho rural mesmo antes da documentação mais antiga, desde que as testemunhas comprovem o fato.
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ Inclusive, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimentos vinculantes na matéria, no Tema Repetitivo n. 638 e na Súmula n. 577:
Tese do Tema n. 638: “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.” (g.n.)
Súmula n. 577: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.” (g.n.)
Porém, é importante observar que as testemunhas são apenas uma forma de extensão probatória, sendo que ainda há a necessidade de documentos como início de prova material, nos termos da Súmula n. 149 do STJ:
“A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.” (g.n.)
Então, apesar de ser possível o reconhecimento do período rural antes do primeiro documento, isso não dispensa a documentação, e deve ser feito com base também no início de prova material apresentado, ok?
⚠️ Não há como buscar a consideração de tempo de trabalho rurícola apenas com base em prova testemunhal, ao menos em regra!
7.2) Trabalho urbano de membro da família descaracteriza o segurado especial?
A resposta é não! O trabalho urbano de um membro da família, inclusive do cônjuge, não descaracteriza a condição de segurado especial para fins da concessão dos benefícios previdenciários. 👩🏻🌾👨🏻🌾
Portanto, mesmo que algum familiar trabalhe na cidade, ainda é possível a aposentadoria rural de quem se enquadra como segurado especial, desde que essa pessoa cumpra com as exigências legais.
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ Essa é, inclusive, a posição dos Tribunais Superiores, como a Turma Nacional de Uniformização, na sua Súmula n. 41, e o STJ, no julgamento do Tema Repetitivo n. 532:
Súmula n. 41 TNU: “A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto.” (g.n.)
Tema Repetitivo n. 532 STJ: “O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).” (g.n.)
Ou seja, o que importa para os fins previdenciários é que a pessoa se enquadre nas exigências legais para ser considerada como segurado especial.
🧐 O trabalho dos seus familiares, a princípio, não é, nem deve ser, um empecilho para essa caracterização.
No entanto, as citadas jurisprudências trazem uma ressalva importante: o “por si só”. Ou seja, se existir algum outro elemento no caso concreto, pode ser que nem o INSS, nem a Justiça, considere o seu cliente como segurado especial.
👉🏻 Exemplos dessas hipóteses de impedimento da caracterização são:
- Outra fonte de renda distinta da rural;
- Trabalho urbano por mais de 120 dias no ano;
- Em alguns casos, patrimônio incompatível com o regime de economia familiar;
- Contratação de empregados de forma habitual e ao longo do ano todo.
Portanto, o simples fato de um membro da família do seu cliente trabalhar na cidade não será problema para a caracterização como segurado especial.
Até mesmo é permitida a atividade urbana intercalada do próprio segurado, que não impede, por si só, a concessão da aposentadoria por idade rural. Mas, de acordo com a Súmula n. 46 TNU, a situação deve ser analisada caso a caso:
“O exercício de atividade urbana intercalada não impede a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser analisada no caso concreto.” (g.n.)
Então, sempre leve em conta a realidade específica de cada cliente, ok? 🤗
7.3) Comercialização de produtos rurais descaracteriza o segurado especial?
Em alguns casos, o INSS diz que o fato do segurado especial vender o fruto do seu trabalho na agricultura ou na pecuária descaracterizaria essa condição e, portanto, impediria a concessão dos benefícios. Mas essa posição não está totalmente correta.
De fato, em alguns casos, como grandes latifundiários ou empresas agropecuárias, a larga escala de venda e produção afasta a caracterização. ❌
Porém, a jurisprudência entende que a comercialização de produtos rurais não é o suficiente para impedir a consideração de alguém como segurado especial.
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ O que precisa ser analisado é se atividade, no caso concreto, é ou não indispensável para a subsistência e desenvolvimento da família no campo.
Veja o que já decidiu a TNU sobre o tema, no PUIL n. 5000363-97.2018.4.02.5004/ES:
“PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. PREVIDENCIÁRIO. A QUALIDADE DE SEGURADO(A) ESPECIAL – TRABALHADOR(A) RURAL NÃO DEPENDE, NECESSARIAMENTE, DA COMERCIALIZAÇÃO DA SUA PRODUÇÃO, DEVENDO SER AVERIGUADA SE SUA ATIVIDADE É INDISPENSÁVEL À PRÓPRIA SUBSISTÊNCIA E AO DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO DO NÚCLEO FAMILIAR. INCIDENTE PROPOSTO PELA PARTE AUTORA CONHECIDO E PROVIDO.” (g.n.)
(TNU, PEDILEF n. 5000363-97.2018.4.02.5004/ES, Rel. Juiz Federal Gustavo Melo Barbosa, Julgado em: 20/11/2020. Publicado em: 23/11/2020)
Afinal, o pequeno produtor rural costuma, na lavoura ou na pecuária, separar uma parte para si e, quando há uma boa safra, vender o excedente para ajudar nas despesas ou comprar algum bem. Isso é normal na prática.
⚖️ E essa comercialização, isoladamente, não pode ser usada como argumento para impedir a caracterização, conforme o entendimento da Turma Nacional de Uniformização.
Inclusive, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região também tem decisões no mesmo sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. CARGO ELETIVO CONCOMITANTE. POSSIBILIDADE. COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS DERIVADOS DA AGRICULTURA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA.
“(…) 4. A comercialização de doces e cachaça derivados da cana-de-açúcar, plantada e colhida pelo segurado, e produzidos de forma artesanal, não caracteriza, por si só, organização empresarial a excluir a qualidade de segurado especial.” (g.n.)
(TRF 4ª Região, AC n. 0002757-95.2017.404.9999, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto SIlveira. 6ª Turma. Julgado em: 07/06/2017. Publicado em: 16/06/2017)
Portanto, utilize esses argumentos na defesa dos clientes que tiveram o benefício negado sob a justificativa de que a comercialização de produtos rurais descaracterizaria a condição de segurado especial.
7.4) Pode usar documentos em nome de outro membro da família?
🤔Uma outra dúvida bastante comum é se o segurado rural pode usar documentos em nome de outro membro da família que não seja o seu próprio.
Felizmente, a resposta é favorável aos beneficiários do INSS!
📝 No campo, como as propriedades são familiares, a documentação, em regra, não é feita em nome de todos os membros do núcleo, mas apenas de algum ou alguns. Antigamente, o homem mais velho, marido ou irmão normalmente era essa pessoa.
A boa notícia é que o entendimento jurisprudencial majoritário é no sentido de ser possível usar a documentação de outro integrante da família para comprovar o trabalho rural com fins previdenciários. É preciso, no entanto, ter testemunhas para corroborar o fato.
Isso deve ser comemorado, porque pode fazer toda a diferença.
⚖️ Inclusive, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no julgamento de um incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), assim decidiu em seu Tema n. 21:
“Viável a consideração, como início de prova material, dos documentos emitidos em nome de terceiros integrantes do núcleo familiar, após o retorno do segurado ao meio rural, quando corroborada por prova testemunhal idônea” (g.n)
(TRF-4, Processo IRDR n. 5032883-33.2018.4.04.0000, Rel. Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, Julgamento em: 21/08/2019).
Porém, há duas exigências para que seja possível a utilização de documentos em nome de familiares para comprovar o período rural.
A primeira delas você já viu: as testemunhas também indicarem que esse labor no campo aconteceu.
Já a segunda é que o familiar cujo nome conste na documentação seja também um segurado rural!
👩🏻⚖️👨🏻⚖️ Do contrário, não será possível esse reconhecimento, inclusive conforme já foi decidido no Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo n. 533.
“Em exceção à regra geral (…), a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.” (g.n.)
Então, se o familiar também é segurado rural, é possível usar os documentos em nome dele para pedir o reconhecimento do tempo trabalhado no campo, como segurado especial. Do contrário, os documentos não valem. 🤓
7.5) Uso de maquinários é compatível com regime de economia familiar?
Em geral, o uso de maquinários é compatível com o regime de economia familiar em pequenas propriedades no campo. Essa forma de trabalho não impede a concessão de aposentadoria por idade rural!
Isso significa que o fato da pessoa usar alguma máquina, como um trator, arado ou equipamento de irrigação, não impede o reconhecimento da qualidade de segurado especial, via de regra.👩🏻🌾👨🏻🌾
A TNU, em algumas ocasiões, como no PEDILEF n. 200970570007609 decidiu exatamente dessa maneira, determinando que não é incompatível com o regime de economia familiar do pequeno produtor rural o uso de maquinário.
Muitas vezes, os trabalhadores rurais em pequenas propriedades usam um trator, um veículo ou ferramentas motorizadas para plantar, colher, além de fazer outras atividades, facilitando o trabalho e aumentando a rentabilidade.
Não há nada de errado nisso e, inclusive, não há nenhuma previsão legal que considere esse fato como um impeditivo ao reconhecimento da condição de segurado especial.📜
A exceção fica por conta de grandes propriedades de produção rural em larga escala, nas quais o trabalho mecanizado, em conjunto com os demais elementos, afasta a possibilidade do enquadramento.
7.6) Arrendamento de terras afasta o reconhecimento de regime de economia familiar?
Na mesma decisão da TNU mencionada acima, também foi interpretado que o arrendamento de uma parte das terras de pequena propriedade rural não impede a caracterização do regime de economia familiar.
👩🏻🌾👨🏻🌾 Portanto, o segurado especial que arrenda uma parte do seu sítio a um vizinho, durante um certo tempo, não perde essa qualidade para os fins previdenciários, ao menos em regra.
Essa é uma posição bastante vantajosa para os beneficiários da Previdência, já que não é raro que essa situação aconteça. Isso, independentemente da cultura ou da atividade desenvolvida na propriedade.
Por exemplo, um sítio pode ter uma grande área de pastagem e, eventualmente, ter uma pequena parcela arrendada a uma pessoa que planta cana-de-açúcar.
Desde que cumpridos os demais requisitos legais e respeitado o exigido em termos de caracterização como segurado especial, este arrendamento é plenamente possível nos casos concretos. 🤗
7.7) Exercício de mandato eletivo descaracteriza o segurado especial?
O exercício de mandato eletivo não descaracteriza a condição de segurado especial perante o INSS, em regra.
Então, esse argumento não pode ser usado como justificativa para a negativa de benefícios rurais, já que não há previsão legal para tanto e, em relação à jurisprudência, há posição favorável aos beneficiários! 📜
Inclusive, um julgado que já citei anteriormente também ilustra bem o entendimento dos Tribunais sobre isso:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. CARGO ELETIVO CONCOMITANTE. POSSIBILIDADE. COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS DERIVADOS DA AGRICULTURA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA.
(…) 3. O desenvolvimento de mandato eletivo de vereador não impede que o segurado continue trabalhando em sua propriedade rural nem desqualifica, a sua condição de segurado especial, pois não exige dedicação exclusiva e integral às atividades políticas, fazendo-se possível, no caso concreto, o exercício concomitante do mandato eletivo e do labor rural.” (g.n.)
(TRF-4, AC n. 0002757-95.2017.404.9999, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto SIlveira. 6ª Turma. Julgado em: 07/06/2017. Publicado em: 16/06/2017)
Portanto, desde que seja possível conciliar o trabalho no campo com o mandato eletivo, não há uma descaracterização como segurado especial.
🧐 O exemplo mais clássico, de fato, acaba sendo o do pequeno produtor rural que se elege vereador, o que é relativamente comum, principalmente em cidades no interior. Nessa situação, não há impedimento.
Contudo, se o mandato eletivo exigir uma dedicação exclusiva, e se tornar incompatível com o regime de economia familiar ou os demais requisitos para a consideração do segurado especial, o cenário é diferente.
O melhor caminho é analisar caso a caso com cuidado e atenção, para orientar os clientes corretamente, requerendo o benefício cabível diante das possibilidades. 😉
8) Conclusão
👩🏻🌾👨🏻🌾 A aposentadoria por idade rural é um dos benefícios mais importantes no sistema previdenciário brasileiro e merece total atenção, dada a sua relevância, além das suas particularidades.
É uma saída de muitos segurados que, de outra forma, não conseguiriam se aposentar porque trabalharam no campo por muitos anos, por vezes até sem efetuar os recolhimentos, diante da realidade do meio rurícola.
Contudo, justamente por ser destinada a um grupo específico de beneficiários do INSS, a aposentadoria por idade rural tem diversas disposições que são diferentes das demais, o que demanda um estudo detalhado e cauteloso dos casos.
🤓 Por esse motivo, no artigo de hoje, trouxe tudo sobre esse benefício para você: os detalhes, os fundamentos legais e a posição da jurisprudência quanto aos principais pontos do assunto.
Além disso, procurei compartilhar dicas práticas para lhe ajudar a conquistar o direito dos clientes em relação à aposentadoria por idade rural.
E já que estamos no final do artigo, que tal darmos uma revisada? 😃
👉🏻 Para facilitar, fiz uma listinha com tudo o que você aprendeu:
- Um breve histórico do tema;
- Quem tem direito a aposentadoria por idade rural são os trabalhadores rurais empregados, os eventuais (bóias-frias), avulsos e os segurados especiais;
- A Reforma da Previdência não mudou esse benefício;
- Os documentos para comprovação da atividade rural estão no art. 48 da IN n. 128/2022, entre eles a CTPS, recibos, fichas de empregados e outros documentos que formem o início de prova material;
- Esse início de prova material é fundamental para o reconhecimento de período de trabalho no campo, e a documentação na forma de certidões escolares, declarações de sindicatos rurais e da Justiça Eleitoral são aceitas;
- A carência para aposentadoria por idade rural deve ser cumprida comprovando o exercício de atividade rurícola por no mínimo 180 meses, mesmo que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento;
- Mas as regras não são as mesmas para todos os segurados rurais, já que há diferenças marcantes;
- As respostas para as 7 principais dúvidas do assunto, entre elas que é possível reconhecer o tempo trabalho rural antes do documento mais antigo;
- Também, que o trabalho urbano de um membro familiar não descaracteriza a condição de segurado especial, assim como a comercialização de produtos rurais, o arrendamento da terra e o uso de maquinário;
- Inclusive, é possível usar documentos em nome de membros da família para comprovação de tempo rural;
- O exercício de mandato eletivo não descaracteriza o segurado especial, desde que compatível.
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Fontes
Veja as fontes utilizadas na elaboração deste artigo na publicação original no blog: Aposentadoria por Idade Rural: Dicas e Estratégias para Advogados Previdenciaristas
Alessandra Strazzi
Advogada | OAB/SP 321.795
Advogada por profissão, Previdenciarista por vocação e Blogueira por paixão! Autora dos blogs “Adblogando“ e "Desmistificando". Formada pela Universidade Estadual Paulista / UNESP.