1) Introdução
O famoso “milagre” da contribuição única do INSS é uma possibilidade que surgiu para aposentadorias requeridas com base nas regras de transição trazidas pela Reforma da Previdência. 📜
Na realidade, não se trata de nenhum “milagre” ou qualquer tipo de fraude, mas simplesmente da aplicação da legislação previdenciária.
Porém, desde que os advogados começaram a divulgar que havia possibilidade de se aposentar com um valor de benefício maior recolhendo uma única contribuição no INSS, o tema despertou o interesse dos segurados e a ira da Previdência (inclusive, sobrou até para mim). 😂
No artigo de hoje, vou trazer tudo o que você precisa saber sobre o “milagre” da contribuição única e qual tem sido o posicionamento adotado pelo INSS com relação às aposentadorias requeridas nesses moldes.
👉🏻 Dá uma olhada em tudo o que vai aprender:
- O que é o divisor mínimo e o que mudou com a Reforma da Previdência;
- Se há possibilidade de exclusão de salários de contribuição no cálculo do salário de benefício após a EC n. 103/2019;
- O que é o “milagre” da contribuição única no INSS (com exemplo de caso prático);
- Tramitação de um PL que acaba com o “milagre” da contribuição única no INSS;
- Considerações sobre se seria justo acabar com essa possibilidade de aposentadoria mediante contribuição única.
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2) O que você precisa saber antes de entender o Milagre da Contribuição Única
Antes de explicar o que é o “milagre” da contribuição única no INSS, preciso que você entenda alguns detalhes relacionados ao cálculo do salário de benefício (mais especificamente o divisor mínimo e a possibilidade de exclusão de salários de contribuição após a EC n. 103/2019).
Prometo que não vai doer, vou explicar tudo de uma forma simples e fácil de entender! 🤓
2.1) O que é Divisor Mínimo nos Cálculos Previdenciários?
Em síntese, o divisor mínimo é um número resultante do cálculo de 60% da quantidade de meses existentes no período básico de cálculo (PBC) do segurado.
⚖️ Surgiu com a Lei n. 8.213/1991, mas até então se tratava de um número fixo (fixou-se 24 meses como divisor) e não de um percentual (vide redação original do art. 29, §1º – revogado pela Lei n. 9.876/1999).
Só a partir da Lei n. 9.876/1999, que alterou profundamente a forma de cálculo dos benefícios previdenciários e instituiu o fator previdenciário, é que passou a ser exigido que fosse aplicado um divisor mínimo no cômputo dos salários de benefícios (SB), sendo este um percentual do PBC.
Mas este divisor mínimo estava previsto somente para a regra de transição. Na regra permanente (para os inscritos após a Lei 9.876/1999), não há aplicação do divisor mínimo.
Ou seja, primeiro você conta quantos meses existem entre julho de 1994 e o mês imediatamente anterior à DIB do segurado e, depois, calcula 60% deste período. O número resultante é o divisor mínimo. 😀
Na época, a justificativa usada pelo legislador foi a de que o divisor buscaria ajustar o benefício do segurado ao valor de suas contribuições, calculando uma média dos salários de contribuição mais próxima à trajetória salarial do trabalhador (na medida em que se exigiria um período mínimo de contribuições no cálculo da média).
😢 Mas, sabemos que a aplicação do divisor mínimo prejudica o valor da média aritmética prevista no art. 3º, §2º, da Lei n. 9.876/1999, nos casos em que há poucas contribuições após julho de 1994.
Então, em resumo: se o segurado tiver poucas contribuições dentro do seu PBC, o divisor mínimo irá diminuir o valor do seu benefício.
“E o divisor mínimo ainda é aplicado, Alê?”
Calma, vou explicar isso no próximo tópico! 😉
2.2) Exclusão de Salários de Contribuição do Salário de Benefício após a EC n. 103/2019
🔙 Antes da EC n. 103/2019 (art. 29 da Lei n. 8.213/1991), a regra geral (com algumas exceções) era de que o salário de benefício (SB) era equivalente à média aritmética simples dos 80% maiores salários de contribuição (SC) desde julho de 1994, “descartando” da média os 20% menores.
Excluindo esses 20% menores salários de contribuição, a média aumenta e, com isso, o segurado tem direito a um benefício de maior valor. 💰
Lembrando que, pela regra anterior, há aplicação do fator previdenciário e do divisor mínimo (e esse cálculo ainda é utilizado nos casos de direito adquirido).
🔜 Após a Reforma da Previdência, o salário de benefício (SB) passou a corresponder à média aritmética simples de 100% dos salários de contribuição (SC) desde julho de 1994 (art. 26, caput, da EC n. 103/2019).
Via de regra, não é aplicado o fator previdenciário e o divisor mínimo (só nos casos envolvendo a regra de transição do art. 17 da EC n. 103/2019 e de aposentadoria da pessoa com deficiência).
Além disso, ainda é possível “descartar” um percentual dos salários de contribuição, mas não é tão simples como antes.
👉🏻 O art. 26, §6º, da EC n. 103/2019, prevê a possibilidade de exclusão de salários de contribuição que resultem em diminuição da média. Olha só:
“EC 103/2019, Art. 26, § 6º. Poderão ser excluídas da média as contribuições que resultem em redução do valor do benefício, desde que mantido o tempo mínimo de contribuição exigido, vedada a utilização do tempo excluído para qualquer finalidade, inclusive para o acréscimo a que se referem os §§ 2º e 5º, para a averbação em outro regime previdenciário ou para a obtenção dos proventos de inatividade das atividades de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal.” (g.n.)
Perceba que a EC n. 103/2019 não diz exatamente quantas contribuições podem ser excluídas. Então, em teoria, a quantidade poderia até ser superior aos 20% (previstos na antiga regra do art. 29 da Lei n. 8.213/1991). 🤯
Mas, deve ser mantido o tempo mínimo, ou seja, não pode excluir prestações que tornem o tempo de contribuição menor que o exigido para a aposentadoria e precisa ser respeitado o período de carência.
⚠️🔴 Também é preciso ter em mente que as contribuições excluídas impactarão no cálculo da RMI (renda mensal inicial), porque o art. 26, §2º, da Reforma da Previdência prevê um acréscimo de 2 pontos percentuais paracada ano de contribuição que exceder o tempo de 20 ou 15 anos.
Desse modo, a exclusão das contribuições pode impedir que o segurado tenha direito a esse acréscimo.
❌ Ademais, as contribuições descartadas também não poderão ser aproveitadas para efeitos de tempo de contribuição e carência. Então é preciso muito cuidado antes de escolher descartar!
2.3) Divisor Mínimo Após a Reforma da Previdência
Com a publicação do Decreto n. 10.410/2020, em 1º de julho de 2020, houve um acréscimo do art. 188-E ao Decreto n. 3.048/1999, que não contém previsão de aplicação do divisor mínimo no cálculo do salário de benefício das aposentadorias concedidas com base nas novas regras trazidas pela EC n. 103/2019.
Isso, no meu entender, respeita a fórmula de cálculo trazida pela EC n. 103/2019.
A única exceção acontece nos casos de aposentadorias concedidas com fundamento no direito adquirido até 13/11/2019, nos termos do art. 3º da Reforma da Previdência. 😃
2.3.1) E qual era a interpretação aplicada antes do Decreto n. 10.410/2020?
Antes da publicação do Decreto, não tinha ficado muito claro se seria aplicado ou não o divisor mínimo após a EC n. 103/2019.
Na realidade, a EC n. 103/2019 não continha previsão expressa sobre a aplicação do divisor, o que já indicava que ele não seria mais aplicado (afinal, tudo o que a lei não proíbe, é permitido). Porém, nem sempre o INSS entendia dessa forma. 🙄
Então, quem defendia a não aplicação do divisor (corrente a qual eu me filiava), fazia isso com base em uma construção hermenêutica (que aprendemos nas aulas de hermenêutica jurídica, lembra?).
🤓 Expliquei tudo isso em detalhes no artigo Salário de benefício: divisor mínimo é aplicado após Reforma da Previdência? [Atualização Decreto 10.410/2020]. Mas, vou trazer um “resumo” por aqui!
Acontece que o art. 26, caput, da EC n. 103/2019, fala que, até a edição de lei disciplinando a forma de cálculo dos benefícios, seria usada a média aritmética simples de 100% dos salários de contribuição e das remunerações adotados como base para contribuições, sem qualquer previsão de aplicação do divisor mínimo.
Já o art. 3º, §2º, da Lei n. 9.876/1999, até prevê a aplicação do divisor mínimo, mas vinculado ao salário de benefício correspondente à média aritmética simples de 80% dos salários de contribuição (art. 3º, caput).
⚖️ Com base na interpretação sistemática, a gente conclui que o parágrafo é um fragmento subordinado ao caput do artigo, tendo sua abrangência restrita, pelo menos inicialmente, em seu âmbito de aplicabilidade.
Portanto, não seria possível aplicar o §2º do art. 3º, da Lei n. 9.876/1999, ao caput do art. 26, da EC n. 103 /2019. A abrangência da regra do divisor mínimo (prevista no §2º do art. 3º, da Lei n. 9.876/1999) deveria se restringir só ao caput de seu artigo.
E lembremos que o divisor mínimo era somente previsto para a regra de transição. Nunca foi aplicado para a regra permanente e não há discussão sobre isso.
👉🏻 Do mesmo modo, para que fosse possível a aplicação do divisor, seria necessária a edição de uma nova lei contendo tal previsão.
Insistir na aplicação do divisor mínimo (previsto na Lei n. 9.876/1999) após a Reforma da Previdência, seria promover uma hibridização de normas, o que não é aceito pelo STF (vide RE n. 630.501/RS). ❌
Para você entender melhor: hibridização de normas é quando se mescla aspectos de cada lei, com o objetivo de criar um novo regime híbrido (decorrente da fusão das leis).
No caso, o regime híbrido seria formado pelo pior aspecto de cada lei: aplicação do divisor mínimo (art. 3º, §2º, da Lei n. 9.876/99) e utilização da média aritmética simples de 100% dos salários de contribuição do período contributivo (art. 26, caput, da Reforma da Previdência).
Enfim, felizmente o Decreto n. 10.410/2020 facilitou as coisas para nós e hoje não é mais preciso fazer toda essa construção para explicar porquê o divisor mínimo não é aplicado, visto que já temos previsão legal expressa nesse sentido. 🙏🏻
3) O que é o milagre da contribuição única?
👉🏻 Basicamente, o “milagre” da contribuição única no INSS é uma tese de planejamento previdenciário que pode ser aplicada nos casos em que o segurado se encontra nessa situação (requisitos cumulativos):
- cumpriu o tempo de contribuição e carência antes de julho de 1994;
- cumpriu o requisito etário após 13/11/2019 e irá se aposentar pelas regras de transição trazidas pela Reforma da Previdência.
[Obs.: Lembrando que o valor das contribuições recolhidas antes de julho de 1994 (data de entrada em vigor do Plano Real) já não é considerado no cálculo das aposentadorias. Apenas os anos de contribuição são considerados para efeito de tempo de serviço e carência.]
Assim, se o advogado fizer os cálculos, analisar o caso em concreto e concluir que dessa forma o segurado terá direito de receber um benefício mais vantajoso, ele pode tentar utilizar a tese do “milagre” da contribuição única. 💰
Digo tentar, porque o INSS cada vez mais tem se posicionado contrariamente a tal possibilidade, conforme explico nos próximos tópicos.
Calma, sei que falei demais e não expliquei como isso funciona na prática, né? Vou fazer isso agora! 😁
3.1) Como o milagre da contribuição única funciona?
⚖️ Como mencionei no tópico 2, a Reforma da Previdência trouxe duas importantes mudanças no cálculo do salário de benefício:
- Ele passou a corresponder à média aritmética simples de 100% dos salários de contribuição desde julho de 1994 (e não mais dos 80% maiores), nos termos do art. 26, caput, da EC n. 103/2019;
- Via de regra, não é aplicado o fator previdenciário e o divisor mínimo;
- É possível “descartar” um percentual dos salários de contribuição que resultem em diminuição da média, desde que mantido o tempo mínimo de contribuição exigido e respeitada a carência (art. 26, §6º, da EC n. 103/2019).
Então, pessoas que irão se aposentar pelas regras de transição, terão suas aposentadorias calculadas dessa forma.
Com isso, se você cumpriu o tempo de contribuição e a carência antes de julho de 1994, pode “descartar” (total ou parcialmente) as contribuições previdenciárias recolhidas depois desse período e conseguir uma aposentadoria mais vantajosa apenas com poucas ou até uma única contribuição (já que o salário de benefício passou a corresponder a 100% dos salários de contribuição desde julho de 1994 e não é aplicado o divisor mínimo).
😯 É isso mesmo: o segurado pode escolher deixar no seu CNIS só aquelas contribuições de maior valor ou então descartar todas e recolher uma única contribuição sobre o teto do INSS, por exemplo.
E mesmo se ele não tiver nenhuma contribuição depois de julho de 1994, também é possível que ele pague uma única contribuição e tenha seu benefício calculado exclusivamente com base nela.
Obviamente, é melhor dar preferência para contribuições de valor igual ou próximo ao teto do INSS, para que o segurado tenha direito a uma aposentadoria maior (mas isso não é obrigatório e a pessoa pode manter contribuições menores, caso não tenha condições). 💰
Enfim, são várias as possibilidades!
👉🏻 Porém, para ficar mais fácil, vou trazer os principais cenários de recolhimento:
- Se há contribuições após julho de 1994, é possível:
– descartar (total ou parcialmente) as menores e deixar apenas a(s) maior(es);
– descartar todas e recolher uma única contribuição sobre um valor maior.
- Se não há contribuições após julho de 1994, é possível:
- recolher uma única contribuição sobre um valor maior.
Só para você ter uma ideia, nesse último caso (inexistência de contribuições após julho de 1994), se o segurado não efetuasse nenhuma contribuição, ele se aposentaria por idade com o valor de 1 salário mínimo (o que atualmente corresponde a R$1.212,00).
Mas, recolhendo uma única contribuição sobre o teto do INSS (o que hoje em dia gira em torno de 20% de R$7.087,22), teria direito a uma aposentadoria por idade no valor de R$4.252,33.
⚠️🔴 ATENÇÃO: Ao fazer a análise, tenha em mente que as contribuições excluídas impactarão no cálculo da RMI, porque o art. 26, §2º, da Reforma da Previdência prevê um acréscimo de 2 pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 20 ou 15 anos.
Desse modo, a exclusão das contribuições pode diminuir o valor do benefício! 🤯
3.2) Por que o “milagre” da contribuição única não é um milagre?
Acontece que isso tudo que expliquei não se trata de nenhum “milagre” ou qualquer tipo de fraude, mas simplesmente da aplicação da legislação previdenciária.
🧐 Isso porque a metodologia de cálculo trazida pela Reforma da Previdência permite descartar tantas contribuições quanto desejar (desde que respeitados os requisitos mínimos de aposentadoria previstos em lei).
São raríssimos os casos em que o “milagre” da contribuição única pode ser aplicado. Até porque as novas regras de cálculo são, na verdade, MUITO prejudiciais à maior parte dos segurados.
👩🏻🙍🏾♂️ Porém, os segurados que cumprem os requisitos que expliquei no tópico anterior, são extremamente beneficiados por essa “brecha” trazida pela Reforma da Previdência.
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3.3) Exemplo de caso com milagre da contribuição única
Sei que a matéria pode gerar muitas dúvidas, por isso vou trazer um exemplo prático envolvendo o “milagre” da contribuição única no INSS.
🧓🏻 Em janeiro de 2020, o Sr. José tinha 65 anos e contava com 25 anos de tempo de contribuição (sendo que 15 anos foram cumpridos antes de 1994 e 10 anos foram cumpridos depois).
Conversando com seu advogado, ele descobriu que poderia se aposentar pela regra de transição da aposentadoria por idade (art. 18 da EC n. 103/2019), que exige 65 anos de idade e 15 anos de tempo de contribuição.
🗓️ Além disso, como Sr. José tem 25 anos de tempo de contribuição, ele poderia, em tese, descartar até 40% dos menores salários de contribuição (SC), percentual referente aos 10 anos que foram cumpridos depois de julho de 1994.
Isso porque os 15 anos de tempo de contribuição anteriores a julho de 1994 são suficientes para preencher o requisito de carência de 180 contribuições e a regra de transição do art. 18 da Reforma.
Ou seja, respeita as exigências contidas no art. 26, §6º, da EC n. 103/2019 para autorizar o descarte. ⚖️
Vale dizer que não existe restrição alguma com relação ao fato de as contribuições consideradas para carência e para o tempo de contribuição estarem fora do período básico de cálculo (PBC).
Além disso, nas regras de transição da Reforma, também não há aplicação do divisor mínimo.
🧐 Portanto, em teoria, o Sr. José poderia descartar até 99% dos salários de contribuição integrantes do PBC. Mas, obviamente, esse descarte faria com que a RMI resultasse em 1 salário mínimo.
Enfim, nesse exemplo prático, caso fosse dar direito a uma aposentadoria maior, o segurado poderia descartar 9 anos e 11 meses de contribuição, mantendo apenas 1 salário de contribuição (exatamente o maior de todos os 10 anos existentes no PBC).
4) Me envolveram na confusão!
Pois é, dessa vez sobrou até para mim… 😢
Em abril de 2021, foi publicada a Nota Técnica n. 07/2021/PRES-INSS (vou deixar o link nas fontes, ao final do artigo).
Resumidamente, essa nota criticava alguns advogados previdenciaristas que haviam publicado conteúdos técnicos sobre a possibilidade do “milagre” da contribuição única no INSS, sob o argumento de que estariam supostamente incentivando os segurados a fraudar o INSS.
📜 Dentre eles, estava o artigo Divisor Mínimo e Reforma da Previdência: Veja o que mudou, de minha autoria.
Nesse artigo, eu explico, de forma tecnicamente fundamentada, porque entendia que não era aplicado o divisor mínimo nos cálculos previdenciários após a Reforma da Previdência (na época, ainda não tinha sido publicado o Decreto n.10.410/2020, no qual ficou claro que, de fato, não há aplicação deste divisor após a Reforma).
Em momento algum eu menciono que o segurado poderia utilizar isso para, de alguma forma, melhorar o valor da aposentadoria. Até porque, naquele momento, eu nem tinha percebido essa possibilidade. 🙄
Enfim, as acusações contidas nesta Nota Técnica do INSS não fazem sentido algum, como explico no artigo Fui acusada de um crime pelo INSS.
O que o INSS precisa entender é que não se trata de um “milagre” ou fraude, mas simplesmente de aplicação da lei previdenciária. Se existe algum responsável pelo prejuízo que isso pode causar à Previdência, é o legislador que adotou essa metodologia de cálculo falha na EC n. 103/2019. 😤
Mas, vale dizer que, através desta Nota Técnica, o INSS foi orientado a suspender as concessões de aposentadorias cujo período básico de cálculo exista apenas poucas ou uma única contribuição em valor superior ao mínimo.
5) Projeto de lei acaba com o Milagre da Contribuição Única
Em fevereiro de 2022, foi aprovado na Câmara dos Deputados o PL n. 4.142/2021 (substitutivo do PL n. 4.491/2021) que, dentre outras matérias, promete colocar fim ao “milagre” da contribuição única no INSS.
Acredito que esse PL tenha sido criado após o alvoroço que a tese da contribuição única causou no INSS. 😖
Em síntese, o art. 3º do Projeto de Lei propõe o acréscimo do art. 135-A à Lei n. 8.213/1991, que teria a seguinte redação:
“Art. 135-A. Para o segurado filiado à Previdência Social até julho de 1994, no cálculo do salário de benefício das aposentadorias, exceto a aposentadoria por incapacidade permanente, o divisor considerado no cálculo da média dos salários de contribuição não poderá ser inferior a cento e oito meses.” (g.n.)
Ou seja, o PL n. 4.142/2021 propõe o retorno do divisor mínimo no cálculo das aposentadorias (exceto a aposentadoria por incapacidade permanente), dessa vez fixado em valor não menor que 108 meses.
“Mas Alê, por qual motivo foi escolhido esse número de 108 meses?” 🤔
Então, provavelmente essa quantidade de meses foi escolhida com base na carência das aposentadorias voluntárias, levando, portanto, ao limite de 108 (correspondente a 60% da carência de 180 contribuições).
No tópico 4.1.1 do artigo Tudo sobre o Divisor Mínimo do INSS de um jeito que você vai entender!, eu explico como esse cálculo já havia sido sugerido pelo Juiz Federal Fábio Souza, em seu voto divergente no Tema n. 203 da TNU.
Vale a pena a leitura! 😀
Lembrando que, atualmente, o PL está em trâmite no Plenário da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC). Portanto, ainda não se trata de lei, mas apenas de um projeto de lei.
[Obs.: Sei que esse PL está recheado de controvérsias, porém não vamos abordá-las neste artigo. Meu objetivo hoje era só mencionar que existe um Projeto de Lei que pretende excluir a possibilidade de se aposentar através do “milagre” da contribuição única no INSS.]
5.1) Haverá respeito ao direito adquirido?
Caso esse PL seja aprovado, estou me questionando se o INSS irá respeitar ou não o direito adquirido. 🤨
Em minha opinião, dois cenários seriam possíveis:
- ✅ Se respeitar, só as aposentadorias com DIB (data de início do benefício) a partir da data de publicação da eventual lei serão calculadas aplicando o novo divisor mínimo;
- ❌ Se não respeitar, todas as aposentadorias que foram concedidas com base nas regras de transição da Reforma da Previdência seriam recalculadas, aplicando o divisor mínimo.
Espero que seja respeitado o direito adquirido, fiquemos de olho! 👀
Vale a pena dizer que colegas advogados têm afirmado que o INSS já está bloqueando ou não concedendo benefícios cujas contribuições se encaixem nesse perfil. 🙄
Mas, como é a própria lei que prevê a regra de cálculo e cria essa “brecha”, a conduta do INSS vai contra a legislação, o que acaba gerando mais uma causa de judicialização de demandas previdenciárias.
Aliás, me conta, como tem sido sua experiência com relação a esses casos? Compartilhe comigo nos comentários! 😉
6) Acabar com o Milagre da Contribuição Única é justo?
Para ser sincera, eu já estava esperando que isso fosse acontecer.
Honestamente, penso que seria justo acabar com a possibilidade de aposentadoria mediante contribuição única no INSS, principalmente em respeito ao princípio do contributivo-retributivo. ⌛💰
Será ruim para as raríssimas pessoas que se encaixam nesta tese. Mas, para a maioria dos segurados, não vejo isso fazendo muita diferença, especialmente se for filiado após julho de 1994.
Confesso que ainda preciso fazer mais simulações e estudar melhor a respeito, para ter certeza dessa opinião. Mas, por enquanto, é dessa maneira que penso.
7) Conclusão
Acredito que o “milagre” da contribuição única é uma das teses que mais causou polêmica no INSS nos últimos tempos, especialmente porque é algo que envolve apenas a aplicação do que está previsto em lei. 📜
O fato de o salário de benefício corresponder à M.A.S. de 100% dos SC desde 07/1994, somado à não aplicação do divisor mínimo e à possibilidade de descarte de percentual indefinido de contribuições, gera o cenário ideal para quem vai ser aposentar pelas regras de transição e cumpriu os requisitos de tempo de contribuição e carência antes de julho de 1994.
Mas, é válido lembrar que o INSS tem se movimentado para acabar com tal possibilidade e, inclusive, há relatos de bloqueio ou não concessão de benefícios cujas contribuições se encaixam nesse perfil (o que, obviamente, tem se tornado alvo de judicialização). ⚖️
E já que estamos no final do artigo, que tal darmos uma revisada? 😃
👉🏻 Para facilitar, fiz uma listinha com tudo o que você aprendeu:
- Conceito de divisor mínimo e mudanças após a Reforma da Previdência;
- Como a EC n. 103/2019 trouxe a possibilidade de exclusão de salários de contribuição no cálculo do salário de benefício;
- O que é o “milagre” da contribuição única no INSS e como isso pode aumentar o valor do benefício na prática;
- PL n. 4.142/2021 e o fim do “milagre” da contribuição única no INSS;
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8) Fontes
Veja as fontes utilizadas na elaboração deste artigo na publicação original no blog: O Milagre da Contribuição Única no INSS: Explicação e Guia de Cálculo [2022].